terça-feira, 29 de janeiro de 2013

TEMA: TRATAMENTO DO ADÀGIO
              "POR BEM FAZER, MAL HAVER"
TÍTULO: FAZER BEM TEM O SEU CUSTO
                (NÃO HÁ RAZÃO PARA LAMENTO)

"QUEM FAZ BEM NÃO OLHA A QUEM"
nem pensa em contrapartida,
só assim pode ser BEM.
E, se o bem fizer... alguém...
para que o BEM em seguida
se salde em belo provento,
não é bondoso... é astuto.
E, esse bem só a contento
não é o "BEM" absoluto...
nem, tão pouco, é BEM GERAL...
é menos bem do que é mal
que moral não é produto...
mercantilismo moral
é regra para mau estatuto.

QUEM FAZ BEM NÃO OLHA A QUEM
e deixa rolar a vida
mais em função do "BEM QUERER"
do que em ter contrapartida.
Se é certo que é muito justo
BEM HAVER POR BEM FAZER...
Fazer BEM tem o seu custo
e, eu... cá por mim... não me assusto
"POR BEM FAZER, MAL HAVER" !....

Matos Serra, in Tratamento dos Adágios

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

TEMA: TRATAMENTO DO ADÁGIO " QUEM TEM MEDO, COMPRA UM CÃO"
TÍTULO: O MEDO É UM GUARDIÃO

O medo é instinto inato...
Provê à sobrevivência
a bem da conservação...
Põe a vida a bom recato,
reguarda a nossa existência...
é, por isso, um guardião.

Causa, é certo... algum abalo...
não é defeito ter medo...
é humano e natural...
É virtude dominá-lo.
Não é mistério, nem segredo,
que a via fundamental
é a via natural.

Para prover uma solução
depende qual medo for...
e, em termos de solução,
é encontrar-se a melhor.
Se for medo da tristeza
pode comprar, com certeza,
uma gaita ou um tambor
ou um bom vinho de mesa...
Se ele for em demasia
deixa logo a chama acesa
nos patamares da alegria
e diz, com toda a firmeza,
e, talvez, com euforia...
adeus à melancolia.

Com medo da solidão
há, até, quem compre um gato...
se for alegre e pacato
é uma boa solução...
é um bom companheirão
e faz guerra a qualquer rato.

Se já passou o estio...
com medo que venha o frio...
por mim, programo e contrato
ir comprar cedo um bom fato.
Com medo que alguém denote
que eu seja pouco moderno...
jamais compro no inverno
uma samarra ou capote...
invisto, pago e arrisco,
com medo da frialdade
num modernaço de um quispo
com alguma qualidade.

Quem tem medo fica em casa
é o que muitos dirão...
Porque fazem tábua rasa
de uma melhor solução.
Por mim... digo, porque não?
arrancar como uma brasa
a comprar um espingardão?

O medo de uma invasão
é uma coisa mais séria...
Qualquer país ou nação
não compra só um canhão
que isso é comprar à miséria...
e nem só um avião...
compra logo a Força Aérea...

Há, até, quem medo tenha
de um moinho ou de uma azenha...
quem se torne um valentão
e lute como um leão
sem nada haver que o detenha...
quem use o seu armamento
contra moinhos de vento...
e, sem ser um Dom Quixote
vá comprar lança ou archote.
Ou, então... parta na mecha
a comprar o facho e a flecha.
Se vá esconder num pote
ou ponha o cavalo a trote...

Quem tem medo do calor,
mesmo sem ser algarvio...
pode ir passar o estio
para as Praias do Alvor.

Quem rejeita o hedonismo
por ter medo do prazer...
tudo o que tem a fazer
é comprar um catecismo.
Se, antes, prefere o suplício
por pensar que o sacrifício
nunca atinge o patamar
que permite o Céu ganhar...
ou se é fã do Santo Ofício...
tem que comprar um cilício
para se autoflagelar.

Contra fobias ou medos,
fraquezas ou frustrações...
nem limites, nem segredos...
para fazer aquisições...
uma pessoa em seu juízo
prevê, sempre, condições
para comprar o que é preciso.

Com medo que a economia
possa vir a fracassar...
seja de noite ou de dia
o que é preciso é comprar.
Como o medo guarda a vinha,
o comércio e a vidinha...
para o comércio estar em alta
o medo faz muita falta.

Quem tem medo que a geada,
quando é negra e atrasada,
lhe destrua a produção...
vai tratar de um subsídio...
fica a conta equilibrada
e, numa tal situação,
não lhe adianta mesmo nada
se for comprar um canídio.

Há sempre uma solução...
se meditarmos no tema,
não vemos qualquer dilema.
Mas... se surgir um problema...
"QUEM TEM MEDO, COMPRA UM CÃO"

Matos Serra, in Crítica aos Adágios Populares.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

  FADO MISTÉRIO

Nigromantes e profetas
dominam letras e temas
de fadistas e poetas
guitarradas e poemas.

As cordas vibram suaves
geme dolente a guitarra,
emoções, canções e naves,
pio agoirento das aves
no cais noturno da barra.

O cais é um ministério
na toada que desgarra,
há não sei quê de mistério,
um sabor a Quinto-Império
mais as trovas do Bandarra.

O trinar de uma viola,
o gemer de um bandolim...
toda a aura que se evola
das Guerras do Alegrim.

Nigromantes e profetas
dominam letras e temas
de fadistas e poetas,
guitarradas e poemas.

   Matos Serra

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

 DE, A MINHA HISTÓRIA DAS LETRAS
"A HISTÓRIA AVENTUROSA DO ( C )"

O "C" é como uma vara que se dobra
e pá para toda a obra...

Até... dizem que o "C" é dois em um...
por isso, embora pertença aos elementos da reserva
está sempre de serviço.

Umas vezes substitui o "K",
outras, substitui o "S"
e, segundo nos parece,
às vezes, afinal,
esmera-se e brilha,
vestindo como fato profissional
a cedilha.

Coitado!
Como é pá para toda a obra...
o trabalho sempre lhe sobra.
às vezes até tem que substituir
a fricativa "X"...
e, para isso, pede ajuda ao "H".

O "C" é excecionalmente trabalhador...
Para cumprir
as suas múltiplas tarefas
como abnegado fonema
assume com denodo
as suas múltiplas virtualidades...

No seu papel de "S"
faz jus a uma articulação dental,
fricativa e sibilante...
como uma pequena brisa
quando passa sobre o monte.

Quando trabalha para o senhor "K"
torna-se velar e oclusivo...
como que a ocultar-se
da sua condição de serviçal.

Em parceria
com o seu camarada "H"
e, de novo, fricativo,
mas... palatal...
assume a sua condição femenina
mas sem ser mariconso...

Para não levantar ondas...
faz-se surdo,
em todas as situações,
nem que o mandem
como porteiro, para as latrinas,
a ajudar o seu companheiro "W".

No entanto, o "C"...
é de ascendência aristocrática...
Neto do velho alfabeto grego
e filho da letra gama, a qual,
também ali...
ocupava o terceiro posto
na escala hierárquica.

É aparentado com o nosso
gutural "G"...
com quem, em tempos recuados,
trabalhou em parceria;
embora mais velho...
trabalhou em submissão àquele...
fazendo-se, também nesta situação,
um pouco surdo, coitado...

Contudo, no tempo imperial dos romanos
foi elevado à categoria de centurião,
e, ainda hoje, em termos numéricos
e tratando-se de datas,
em determinadas
cerimónias oficiais...
na hierarquia dos símbolos
o mandam representar a centúria...

Aí... vale por cem,
razão pela qual alguns dizem
que tem a mania das grandezas...
por mim direi: sim representa-as...
e sou mesmo da opinião
que é uma forma de assumir
uma contrapartida
por ter vindo da sua ascendência
aristocrática para servir nos lavabos "WC".

O seu apelido de família
perde-se na noite dos tempos.

Fez a sua evolução
passando pelo alfabeto grego
como já dissemos em epígrafe.

Se recuarmos
para a noite escura dos tempos...
podemos ir até ao seu bisavô "gimel"
- o semítico...
já conhecido três séculos
antes de cristo.

Para lá dessa data...
perdemos-lhe o rasto
na noite escura dos tempos,
mas... fica-nos a curiosidade
sobre toda a História
dos seus antepassados...

CONTARELO SOBRE O "C"

Descendente do semítico "GIMEL"
passou p'la Grécia
mantendo-se fiel
à sua tradição de bem servir...
em Roma foi promovido a centurião...
e hoje, no nome de Cristão
continua a trabalhar
e a resistir!.....

  Matos Serra

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

MÃOS INIBIDAS OU MÃOS LIBERTAS

No pema que se segue o mote parte de uma perspetiva providencialista da vida, mas o poema que é uma análise do mote, contesta essa perspetiva em prol de uma visão ativa da vida.O mote, dado por um grande poeta alentejano, é um repto que aceitei.

         MOTE
Se uma mão embala o berço
do seu filho pequenino,
a outra desfia o terço
rezando p'lo seu destino.

POEMA SUBORDINADO AO MOTE

E, não seria melhor
que a outra mão libertada,
mais ativa e conjugada
assumisse outro vigor?
Em vez de ser mão prostrada,
'stivesse mais ao dispôr?
Mão terna e mobilizada
que desse à vida alto preço...
que não fosse mão passiva?
Não deve outra estar cativa
Se uma mão embala o berço.

Se a primeira é mão ternura
deve a outra ser liberta...
estar pronta, estar alerta,
não assumir a postura
de uma mão pouco disperta.
Deve ser a mão segura,
firme e meiga mão aberta.
Mão que 'screve a traço fino...
mão que afaga, indaga e ama...
com amor traça o programa
Do seu filho pequenino.

Se essa mão que ama e afaga,
que é mão terna, mão subtil...
se tornar a mão senil
onde toda ação se acaba...
ou mão presa num ardil
de qualquer ideia vaga...
deixa de ser mão viril...
é menos mão que tropeço
e perde desenvoltura
quando vaga e insegura
A outra desfia o terço.

A mão, que é fonte de ação,
alavanca ou instrumento,
tanto serve o pensamento
como serve o coração;
se ficar no desalento,
em beata prostração
ou em prostrado lamento
fazendo apelo ao Divino...
Não é mão, é frustração
à espera de solução
Rezando p'lo seu destino.

  Matos Serra

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

 HINO À PAZ E À CORAGEM


Não!... à coragem dos cavaleiros do Apocalipse!
Porque esses têm banhado de sangue
a terra inteira!...

Não queremos mais espadas,
ou canhões...
nas mãos dos loucos...
nem, tão pouco, como brinquedos
nas mãos das crianças!...

Sim! À coragem de um sorriso franco.
Não à fraqueza daqueles
que disfarçam a sua cobardia
oferecendo-se como guardas pretorianos
aos senhores do mundo!...

Sim àqueles que continuam
a dispor-se a pagar,
com o seu sangue,
o seu suor
e as suas lágrimas...
o futuro de um mundo
com mais amor,
mais razão
e mais justiça.

Não aos predadores
que atraiçoam a verdade,
criam monstros
e ameaçam a paz!...

  Matos Serra

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

É PRECISO IV

      É PRECISO IV

É preciso avisar toda a gente
como dizia a voz do poeta...
É preciso não ficar indiferente,
ter à frente um caminho, uma meta.

É preciso não dormirmos na forma,
ser-se soldado, sentinela atuante...
É preciso iluminismo e uma norma
cada um ser discípulo de um Kant.

Procurar-se na razão o alento
p'ra saber pôr as cartas na mesa...
que um soldado informado e atento
é que vence com tento e firmeza.

É preciso à razão darmos voz,
unir vozes à voz da razão,
conhecermos os nãos e os prós,
'struturarmos desta luta a ação.

É preciso ter-se a têmpera do aço,
não cedermos à vulgar frustração...
que é preciso travarmos o passo
e contermos os coveiros da Nação.

É preciso juntar muitos mil
pela paz, o trabalho e o pão,
que é preciso refazermos Abril
e erguermos, de novo, a Nação.

É preciso a produção e a riqueza
serem o lema, o grito, o pregão...
p'rá justiça ser princípio e certeza
cada qual tenha dela a noção !.......

IMPROVISO
Matos Serra, in Grito Pela Unidade e Ação.

 

sábado, 5 de janeiro de 2013

UM CASTELO NA PLANURA
A extensão da planície transtagana,
como chamou Camões ao Alentejo...
é mãe da mais pura prol humana
onde eu nasci, cresci e me revejo.

Se o canto fosse um doce realejo,
balada ou hino, ou harpa, ou um hossana...
e eu fosse o poeta que desejo
cantava a nossa alma alentejana.

Ó castelo... tão belo e altaneiro...
debruçado sobre o mar que é a planície
onde meu coração anda em viagem...

És o ponto mais alto, és um luzeiro
de onde abarco o sonho, á superfície
das ternas ondas verdes da paisagem.

  Matos Serra, in Belezas do Alentejo.